domingo, 13 de fevereiro de 2011

Superfície

Após a postagem a respeito de Cisne Negro, percebo que os dois textos aqui escritos levam a uma questão que considero bastante incômoda, nos tempos atuais. Recepção.

Christopher Nolan, para muitos, é atualmente um expoente do cinema norte-americano, com seu A Origem, Cavaleiro das Trevas, etc. A idéia é que Nolan trabalha dentro do cinema de gênero, atingindo profundidade. Por outro lado, temos M. Night Shyamalan, cuja carreira está em decadência filme após filme, desde o sucesso de O Sexto Sentido. Assim, colocando no "papel", me parece tão lógico: como é possível?!

Cisne Negro é um filme ousado e artístico, já li muito esse artístico por aí. Já a Sétima Alma é uma profusão de clichês e maus diálogos em um roteiro incompreensível. São as impressões gerais a respeito dos filmes. Poderíamos colocar na roda, também, Showgirls, do Paul Verhoeven, clássico exemplo de filme considerado fracasso total de um grande cineasta, asism como A Sétima Alma, de Wes Craven, e Fim dos Tempos, de Shyamalan. Os três filmes, curiosamente, são exemplos do que melhor é, ou foi, feito em Hollywood nos últimos anos.

Superfície e profundidade. Os filmes de Nolan me incomodam especialmente, pois já partem do pressuposto de que filmes de gênero são inferiores e os dele são especiais, por serem dotados dessa suposta profundidade.

O roteiro de A Origem é considerado uma coisa incrível, tem recebido vários prêmios. No aspecto formal, o roteiro é bastante esforçado, deve ter sido, aliás, um processo bastante cansativo. Muito mais que um grande roteiro, é um roteiro extremamente vaidoso. Tudo a serviço de nada. Então por que não assumir esse nada? Não poderia ser apenas um filme de ação, divertido e só? Imagina, Nolan é um sujeito muito inteligente para fazer um filminho de ação qualquer. Ele precisa construir um labirinto de roteiro para demonstrar sua inteligência. E que tudo esteja relacionado a um drama do personagem. Pronto, temos um filme de gênero com cérebro!

Já o "tenebroso" roteiro de A Sétima Alma, além de muito mais honesto, é zilhões de vezes mais ousado e criativo. Craven utiliza todos os clichês possíveis e cria um filme que não se parece com qualquer outro slasher. É acusado de incompreensível quando, na verdade, é muito simples. A absorção é apenas superficial - se o filme de Wes é mais um slasher com adolescentes correndo de um assassino, que utiliza vários clichês e tem uma trama confusa, ele é apenas um mau filme, uma repetição. Mas o filme não esconde nada, tudo o que precisa ser compreendido está lá. E o que precisa ser compreendido não é como as almas pulam daqui pra lá. Ou que a revelação do assassino, tão aguardada na triologia Pânico, aqui inspiradamente frustrante, seja impressionante. A inteligência do filme está na forma como utiliza o gênero para abordar certas questões e, justamente, na frustração de certas expectativas. (Muitíssimo curiosamente, se Wes tivesse dirigido apenas um slasher clichê e convencional, como foi acusado, seu filme jamais seria tão atacado!, pois seria de simples fruição.)

A Sétima Alma, sim, é um filme inteligente. Showgirls, sim, é um filme inteligente, em que todo clichê possível está lá e o resultado e um filme absolutamente único, não há nada parecido. Como Rivette disse, é o mais puro Verhoeven. E A Sétima Alma é o Showgirls de Wes Craven, o filme que mais tem a sua cara, sua visão, seu senso de humor. Em Fim dos Tempos, Shyamalan frustrou a todos com seu quase filme B, um anti-catástrofe. Lá, novamente, estão toda a sua visão e temas de interesse, senso de humor peculiar. Todos os três filme possuem um senso de humor bastante particular e, ao que parece, incompreendido. Os três filmes vão contra o padrão do que é bonito, do que é bom - uma boa atuação, um bom roteiro. Na superfície, de certa forma, são três filmes ruins. Mas esses não são filmes superficiais.

Na superfície, A Origem é um filme esteticamente impressionante, para os mesmos impressionáveis de Cisne Negro. É um produto de luxo. E, como todo luxo, supérfluo.

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